terça-feira, 3 de outubro de 2017

Currículo Funcional, Qualidade de Vida e Transição para a Vida Ativa da Pessoa com Deficiência

O tema Currículo Funcional, como uma abordagem pedagógica de transição para a vida adulta (TVA) é chave no desenvolvimento humano da Pessoa com Deficiência, em particular aquelas que são jovens, jovens adultos e adultos, os/as quais ainda permanecem infantilizados por não encontrarem oportunidades de desenvolvimento humano.
No Brasil há iniciativas de trabalhos que adotam o Currículo Funcional, todavia a ênfase do que é desenvolvido em algumas instituições, profissionais ou mesmo em nível municipal e estadual é colocada no ´funcional´e não na Transição para a Vida Ativa.
Isto ignifica que a pessoa com deficiência aprende algumas ´funções´ ou desenvolve sua ´funcionalidade´para cozinhar (muito comum), produzir algo no âmbito de papelaria (cadernos, blocos) ou construir bijuterias, pinturas, mobiles, etc. mas sua produção se mantém circunscritas à instituições ou escolas e não implica a transição para a vida adulta produtiva e remunerada.
Por exemplo, há milhares de oficinas de pintura, artesanato, bijuterias, gastronomia (pães, bolachas, trufas), madeira, papelaria, manicure, entre outras espalhadas em instituições em território nacional, MAS a atividade ´curricular funcional´em si mesmo desenvolvida não tem como objetivo principal preparar para a Vida Ativa, inserir no mercado de trabalho local (no bairro onde moram) e, mais importante ainda, gerar autonomia e independência financeira.
Ao contrário, as produções que são vendidas dentro das próprias instituições, para visitantes ou em feiras e ações externas geram recursos usados na compra de materiais ou para realização de alguma atividade porque as prefeituras e os estados não suprem as demandas financeiras...
Se comparado a experiências institucionais internacionais - por exemplo, na Holanda, Alemanha, Dinamarca, Inglaterra*, países nos quais visitei instituições segregadas onde vivem pessoas com deficiências. Estas instituições possuem recursos - para nós brasileiros/as - inimagináveis: profissionais altamente qualificado em áreas específicas (com mestrado e doutorado), recursos de todo o tipo e muiiiiiito dinheiro(!).
Por exemplo, na Inglaterra visitei uma instituição-escola para crianças com deficiência física em 1995/1996. Quando cheguei havia um carro (tipo doblo) da escola trazendo estudantes que já era todo adaptado e (pasmem!) o motorista era uniformizado e treinado para ajudar estas crianças. Na entrada da escola, com corredores bem amplos havia em torno de 40 cadeiras de rodas! Durante a visita estava passando em frente a um toilette quando presenciei uma fisioterapeuta chegar naquela área trazendo uma menina obesa em um ´veiculo movido a controle remoto´ que entrou na área do banheiro. A fisio, então, ativou o dispositivo levantando a menina com as correias que a sustentavam e a colocando no vaso sanitário. Quem estava comigo explicou que o veiculo assegurava que a profissional não tivesse problemas de coluna!!!
Na Holanda, visitei uma instituição onde moram muitos jovens, adultos e idosos com deficiência e também atende crianças pequenas. Esta instituição está localizada em uma área que ocupa o espaço de um bairro pequeno e que, no passado, foi destinada ao isolamento de pessoas com doença mental. Neste ´bairro´há casas nas quais moram pessoas com deficiência. Seus quartos são individuais e absolutamente pessoais e cheios de recursos (como quartos de jovens adolescentes em filmes americanos): TV, aparelhos de som, toca CDs (na época em uso), bichos de pelúcia, jogos, equipamentos de som, etc. A pessoa que me levou nesta visita havia adotado desde pequeno dois rapazes irmãos orfãos que viviam neste espaço desde muito cedo... (note que a adoção não implicava ir viver com a família...)
Na Dinamarca visitei Soelund em 2012, uma instituição para pessoas jovens e adultas com diferentes tipos de deficiência. Havia simplesmente 750 funcionários, incluindo profissionais terapeutas, acompanhantes, etc. para 250 pessoas institucionalizadas. Ou seja: 3 funcionários para 1! Ali havia casas enormes com jardins para cada 08 pessoas com cozinhas maravilhosas que nunca eram usadas porque a comida vinha pronta(!), piscina aquecida (claro! a Dinamarca é um gelo) e, uma sala de estimulação sensorial imensa chamada snoozelen.
Na Alemanha, foi chocante saber que havia em torno de 5.000 estudantes da Educação Especial que também aprendiam a ensinar uma disciplina (matemática, línguas, geografia, etc) porque o sistema é todo segregado. Por exemplo na maravilhosa cidade de Cologne (a quarta maior cidade da Alemanha), com em torno de 1 milhão de habitantes (Campinas no estado de SP tem em torno de 1 milhão) havia na época 20 escolas especiais bem grandes e muitos atendimentos domiciliares, hospitalares, particular, etc.
Enfim, enquanto na Europa os países tem recursos financeiros, humanos e materiais, as pessoas com deficiência estão segregadas e impedidas de se desenvolverem. Aqui no Brasil, por outro lado, temos uma das mais avançadas politica de inclusão social e educacional e falta de recursos financeiros, materiais e humanos que nos impedem de colocar o marco político-legal em pratica de forma efetiva, o que justifica ainda (e infelizmente) a manutenção de práticas de infantilização de jovens e adultos com deficiência independentemente de suas características de aprendizagem.
Em 2008-09 iniciamos na Universidade Federal da Paraíba o Projeto de Extensão Universitária PRÓ-LÍDER - promovendo a autoadvocaia de jovens com deficiência associado a uma pesquisa de mestrado (acesse: Nada sobre Nós sem Nós: promovendo a autoadvocacia de jovens com deficiência ) que evidencia que com oportunidades todos/as tem chance de se desenvolver e se tornar mais independente e autônomo. Um dos jovens surdo e com comprometimento motor se tornou delegado do movimento em defesa dos direitos dos jovens. Duas jovens - uma surda e outra cega entraram na universidade, um jovem com deficiência intelectual passou a trabalhar no Carrefour e aprendeu a se posicionar frente a discriminação e preconceito...
Com tudo isso quero dizer que não há soluções fáceis, mas que tanto quanto qualquer um de nós e de nossos filhos/as sem deficiência a pessoa com qualquer tipo de deficiência tem direito a se tornar autônoma e independente assim como a receber pelo seu trabalho e ser encorajada a produzir para ser inserida no mercado de trabalho-mesmo que este tenha caráter informal.
No dia 12 de Setembro de 2017 houve em Brasilia, promovido pela Câmara dos Deputados e coordenado pela equipe do Deputado Eduardo Barbosa o I SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE EDUCAÇÃO AO LONGO DA VIDA, no qual abordei o tema dos Currículos Funcionais. Você pode assistir à minha palestra e à todo evento se quiser clicando em:









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* A Ingla terra é um país onde há uma forte tendência inclusiva que foi iniciado com a publicação do Relatório Warnock na década de 70, que lançou o conceito de necessidades educacionais e influenciou o movimento da inclusão no mundo. É dito que o país tem em torno de 1% de escolas especiais...
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