segunda-feira, 31 de outubro de 2016

O Filme “Teoria de Tudo” conta a história de Stephen Hawking e traz reflexões importantes sobre a experiência da deficiência

Jackeline Susann Souza da Silva



A “Teoria de Tudo” é um filme que marca na memória por sua história envolve, emocionante e, sobretudo, reflexiva, ao nos levar a pensar sobre quem somos e o valor da vida. Sem falar na brilhante atuação de Eddie Redmayne que protagonizou perfeitamente Stephen Hawking e de Felicity Jones vivendo a forte Jane Wilde Hawking, a primeira esposa de Stephen. Este filme narra a história real do cosmólogo britânico — hoje um dos mais consagrados cientistas mundiais — e foi inspirado no Livro escrito por Jane chamado “My Life with Stephen”.

Se ainda não assistiu veja um trecho no Trailerhttps://www.youtube.com/watch?v=SbUVNHdPE4w

Além de motivá-los(as) a assistir esta grande obra cinematográfica, o objetivo desta postagem é adentrar nas questões vividas por Stephen e Jane, relacionando-as com as temáticas discutidas no campo plural da deficiência. A seguir destaco pontos relevantes para discussão e análise.

A experiência da deficiência pode atingir qualquer um de nós.



Quando falamos em deficiência, parece ainda uma questão muito distante, fora do nosso contexto de vida, mesmo o Brasil registrando a marca de aproximadamente 24% da população que se enquadram nesta categoria, conforme aponta o último censo do IBGE (BRASIL, 2010). Falar de deficiência é uma atribuição vinculada, na maioria das vezes, a especialistas, professores(as) e familiares, pressuposto que acaba por isentar todas as demais pessoas da responsabilidade social com este coletivo.

A história de Stephen Howinkig ilustra como a deficiência é uma característica que pode afetar qualquer pessoa que tenha uma vida normal. No auge da sua juventude, aos 21 anos, Stephen descobriu uma doença degenerativa (esclerose lateral amiotrófica) e recebeu o diagnóstico de que esta doença paralisaria seus músculos, comprometeria por completo o desempenho do seu corpo e fala e provocaria sua morte prematura.

Assim como Stephen adquiriu deficiências, o número de pessoas que viveram a experiência de se tornar uma pessoa com deficiência no Brasil chega a ser 51% do total de pessoas registradas com algum tipo de deficiência no país, ou seja, número maior do que as que recebem o diagnóstico ao nascer. A deficiência pode surgir de uma acidente, fratura, tentativa de homicídio, motivos de doença ou por chegar a terceira idade. Fica o questionamento:

Se deficiência é uma marca de identidade característica de nossa população pelo grande percentual de brasileiros e brasileiras, pela própria condição humana de envelhecimento e pelas possíveis fatalidades, por que é um tema não popularizado que permanece ilhado e de causa social atribuída somente aos sensibilizados, especializados e familiares? Por que ainda existem tantas barreiras nos ambientes e, sobretudo, nas atitudes?

A invisibilidade desta população (Ferreira, 2004; Soares, 2010; Farias, 2011) e a pouca responsabilização coletiva acerca da efetivação dos direitos das pessoas com deficiência nas diversas áreas da vida (saúde, mundo do trabalho, lazer, relações de amizade, sexualidade, escolarização, entre outras) têm como consequência a criação e perpetuação das barreiras no ambiente e nas relações humanas. O mundo que vivemos tal como está não acomoda nossa própria condição de diversidade e diferenças de intelectualidade, funcionalidade, comunicação e interação. 

Assim, o filme deixa a mensagem de que a deficiência não está fora da nossa constituição humana, ela é parte do universo e pode a qualquer momento introduzir-se no nosso mundo particular; por isso necessitamos, de forma empática, romper com o imaginário que cria fronteira entre os(as) “não deficientes” e os(as) “deficientes” para assumirmos uma atitude de responsabilidade coletiva.

O diagnóstico negativo é a primeira barreira que precisamos romper.



Stephen tinha uma saúde normal. Aos 21 anos, já demonstrava genialidade e era um dos jovens promissores ao título de doutorado em uma nomeada universidade britânica. Nesse caminho, começou a perceber uma estranha reação em suas mãos por sentir dificuldade para segurar o giz e por seu andar que não seguia o ritmo habitual. Após uma série de exames, Stephen descobriu que sofria de uma doença grave e que dali por diante sua maneira de viver mudaria drasticamente.

No momento em que recebe o diagnóstico da doença, Stephen encarou o médico em um corredor gélido de tons cinzas. Escutou em silêncio as palavras do profissional que descreveu pausadamente o quadro decrescente e irreversível da sua enfermidade. O médico finalizou sua fala prevendo o tempo de vida máximo de dois anos para Stephen, período em que a doença já atingiria seu mais alto grau.

A Medicina é o campo credenciado para medir, comparar e avaliar as alterações corporais/mentais e, com isso, emitir diagnósticos preventivos ou/e curativos. Para isso, existem definições e padrões, como descritos nos manuais da Organização Mundial de Saúde, que servem de base para análises comparativas dos(as) profissionais sobre o estado de saúde dos(as) seus pacientes; enquadrando, assim, reações, enfermidades e deficiências aos critérios médicos e farmacológicos.

Por muito tempo a apropriação médica do diagnóstico sobre deficiência trouxe consequência graves para a vida dessa população, uma vez que a deficiência era interpretada como uma condição meramente individual, uma “tragédia pessoal” (Oliver, 1983) que precisava ser “curada”, medicalizada e normalizada. Por causa disso, esse grupo foi privado de direitos, mantido em instituições especializadas e cortado do convívio social. Na segunda metade do século passado, o movimento de pessoas com deficiência protagonizou ações intensivas de reivindicação que deram visibilidades às barreiras sociais, responsáveis por restringir e negar os direitos humanos desse grupo. Inicia-se aí a discussão sobre deficiência contextualizada nas esferas coletiva, política, histórica, social, cultural e econômica.

Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas (ONU, 2006) é resultado da luta social por reconhecimento dos direitos das pessoas com deficiência. Esta convenção teve impacto mundial e reforça modelo social da deficiência (hoje é o modelo mais bem aceito pelo movimento), assumindo que esta marca é construída em meio a limites sociais (e não individuais como se acreditava) e que, portanto, se faz urgente a adoção de medidas inclusivas e acessíveis para modificar a sociedade.

Receber um diagnóstico de doença grave é um momento sensível, de muita dor e revolta, foi o que aconteceu com Stephen. O sentimento inicial provou seu isolamento e reflexão profunda sobre as impossibilidades da doença e sua possível morte. O mesmo acontece com as pessoas que adquirem uma deficiência e com mães e familiares que recebem a notícia da chegada de um(a) bebê com deficiência. Os relatos principalmente das mães mostram o quando o diagnóstico negativo interfere na relação da família com os(as) seus(as) filhos(as).

Recordo o caso de uma jovem mãe de uma criança diagnosticada com autismo que nos contou ter sido surpreendida pela fala do médico no dia em que seu filho nasceu: “ele disse que meu filho tinha um problema grave e que não adiantava fazer nada porque ele iria vegetar, além de ter pouco tempo de vida”. Ela acrescenta que estas palavras entraram em seu “peito como um punhal”, passando um sentimento de culpa, de rejeição e de vergonha. Nos primeiros anos não saia de casa com seu filho e evitava falar do assunto quando as pessoas comentavam. Foi um momento de luto. Contradizendo o diagnóstico, a criança hoje tem dez anos, caminha e come sozinha, escolhe as roupas que quer vestir, brinca com sua irmã, frequenta à escola e é bastante interessada em recursos digitais.

Tanto a experiência desta criança como a história de Stephen provam que é possível desconstruir diagnósticos incapacitantes. 

Quantas famílias são desacreditadas das capacidades de seus filhos(as) com deficiência pelas instituições sociais como escola e hospitais? Quantas crianças com deficiência são impedidas de aprender e conviver nos diferentes espaços porque recebem chances escassas e pobres de desenvolvimento por causa de um diagnóstico de que elas não terão progresso? 

Imaginemos se o diagnóstico tivesse paralisado, de fato, Stephen Hawking de tal maneira que ele não encontrasse mais sentido para viver? No mínimo deixaria um planeta inteiro órfão da sua teoria sobre tempo e buracos negros.

Portanto, a segunda lição que fica do filme é que precisamos desconstruir diagnósticos incapacitantes e não limitar a nossa capacidade de estarmos vivos, em qualquer que seja a condição pessoal. Viver é uma estrada de possibilidades, uma arte complexa e misteriosa.

Jane Hawking foi tão responsável pelo sucesso de Stephen Hawking como ele mesmo: Cuidado, Mulher & Deficiência.


Durante a exibição de todo o filme chama a atenção a presença de Jane Wilde Hawking na vida e carreira do cientista Stephen Hawking: Ela cumpriu a função do cuidado integral e foi sua grande incentivadora desde que ele descobriu a doença. O papel de Jane foi preponderante para o desenvolvimento e sucesso de Stephen Hawking.

Historicamente, a função de cuidar foi destinada às mulheres e por isso naturalizou-se que esta é uma tarefa feminina. Ainda hoje, desde a infância as meninas aprendem a tomar responsabilidade sob os demais, cuidando dos irmãos, dos colegas menores, dos pais e das “coisas da casa”. Não é à toa que ouvimos com frequência que “meninas amadurecem mais cedo que meninos”, essa frágil ideia nada mais é do que um excesso de atribuição e cobrança destinada às meninas, para que estas criem um senso de responsabilidade com o bem-estar e cuidado com seu entorno e com os outros. Esse cultura reflete no mundo do trabalho em que as mulheres ocupam a maioria das profissões que remetem ao cuidado como docência, enfermaria, assistência social e psicologia (Cruz, 2012).

Com as lutas feministas, muitos direitos foram alcançados. No entanto, a mulher contemporânea vive outros tipos de condicionamentos que estão por trás da sua suposta emancipação. A carga de ter que trabalhar e estudar fora não diminuiu o trabalho doméstico por ela ser a principal responsável de cuidar das múltiplas tarefas da casa, dos(as) filhos(as), das pessoas idosas e doentes. A intensa jornada de trabalho coloca as mulheres em posição de desvantagem social ao criar barreiras, produzir desigualdades de gênero e privá-las de direitos, como, por exemplo, ter pouco tempo para investir em uma carreira profissional ou realizar uma atividade de lazer.

Todos os aspectos que circunscrevem o papel social e o lugar da mulher se intensificam quando ela tem um(a) filho(a) com deficiência, um familiar ou um(a) parceiro(a) que necessita de seus cuidados. A relação passa de mãe ou esposa para cuidadora. Uma função que exige sua atenção integral. A baixa renda é um fator agravante que influência o estado de vulnerabilidade da mulher-cuidadora. Ao não dispor de recursos, ela se ver na obrigação de suprir as faltas sozinha, por exemplo, quando não tem um carro ou dinheiro para pagar um táxi e tem que levar frequentemente o filho com paralisia cerebral até a clínica de reabilitação, enfrentando um transporte público precário e a falta de acessibilidades das ruas; quando cuida e sustenta uma filha com deficiência porque o marido foi embora sem assumir suas obrigações afetivas e financeiras; quando é obrigada a ‘abrir mão’ de uma profissão para acompanhar o filho com autismo porque a escola viola o direito de dispor de um(a) cuidador(a) e ela não encontra opções.

O mesmo aconteceu com Jane, quando conheceu Stephen era estudante de Artes que almejava seguir um futuro profissional, mas teve que deixar carreira de lado para se dedicar ao marido, cuidar da casa e dos filhos. Stephen necessitava do apoio de Jane para tudo: se alimentar, tomar água, trocar de roupa, escovar seus dentes, subir escadas e até para carregá-lo quando não encontrava acessibilidade nos lugares que frequentava. E assim, foram os 30 anos de casados, até que com o passar do tempo foi possível perceber nas cenas o peso da sobrecarga no rosto de Jane, que demostrava muito cansaço e a necessidade de ajuda.

Imaginemos a seguinte situação irrealística: Se as mulheres se unissem e realizassem uma greve mundial de um mês deixando de exercer qualquer atividade doméstica e de cuidado, com o propósito de reivindicar reconhecimento dessas tarefas, mostrar sua relevância e conquistar direitos domésticos (como políticas públicas e atenção legal a divisão do trabalho doméstico). É seguro que viveríamos um momento de grande caos e instabilidade social.

Este filme nos mostra a importância social do cuidado e da interdependência. Nas experiências com pessoas com deficiência graves a necessidade do cuidado ganha mais visibilidade, no entanto, essa é uma função social que mantêm o funcionamento das instituições sociais, sejam públicas ou privadas. 

Desta forma, a terceira lição que o filme nos leva a pensar é que é preciso discutir este tema, ampliar o debate e construir políticas, estratégias e ações que apoiem as mulheres-cuidadoras, bem como desenvolver a consciência social de que a tarefa de cuidar e as atividades domésticas são de responsabilidade coletiva.

A Acessibilidade e os Profissionais Assistivos permitiram saltos para o descobrimento do universo.


O suporte oferecido a Stephen através das tecnologias e profissionais assistivos foi o que lhes permitiu realizar atividades no dia a dia e seguir com sua carreira de cientista. A cadeira de roda elétrica lhe forneceu autonomia, uma vez que ele pôde monitorá-la sozinho e com isso circular com maior liberdade e frequentar à universidade; depois que Stephen perdeu a capacidade de falar, o sintetizador de voz foi um recurso que lhe oportunizou comunicar-se, realizar conferências e até escrever seus livros.

É indiscutível que o avanço tecnológico proporciona maior qualidade de vida as pessoas com deficiência. Os relatos de amigas cegas ilustram a relevância da tecnologia em sua vida, especialmente quando os recursos são desenhados dentro dos padrões de acessibilidade. O uso de smartphone vem se tornando uma ferramenta indispensável no cotidiano de pessoas com deficiência, pois lhes oferece acesso à informação, permite realização de pesquisas online e interação por meio das redes sociais e chat, algumas vezes, comportam recursos para descrição de imagens e vídeos, além de dispor de aplicativos de acessibilidade. 

De forma geral, o acesso à tecnologia e acessibilidade ajuda a diminuir os limites condicionados por deficiências graves e estas pessoas deixam de ficar à mercê somente do apoio humano, por exemplo, quando desejam obter uma simples informação, podem usar um computador adaptado para buscá-la na internet.

Além das tecnologias como um recurso de/para acessibilidade, o filme nos mostra a importante dos profissionais assistivos, como cuidadores e enfermeiros, que desenvolvem um trabalho fundamental para melhorar as condições de vida das pessoas com deficiência. No período em perdeu a fala, Jane tentou ensinar Stephen a comunicar-se através um recurso de comunicação alternativa. Com Jane, Stephen se mostrou resistente…

Como um cientista com ideias tão abstratas agora sem nenhuma possibilidade de se expressar oralmente iria conseguir expor o que pensa? A acessibilidade e o apoio profissional tornam-se meios de chegar a este fim!

Jane resolveu compartilhar a responsabilidade e contratou uma enfermeira. A profissional com sua longa experiência conseguiu que Stephen aprendesse a se comunicar-se e interagir na sua nova condição.

A quarta reflexão que o filme nos deixa é que a acessibilidade, os recursos assistivos e o apoio de profissional garantem condições dignas e favorecem o desenvolvimento pleno das pessoas com deficiência. O avanço científico e tecnológico cada vez mais permite que as pessoas com deficiência adquiram autonomia para realizar suas atividades diárias e, com isso, coloquem em prática desde ofícios corriqueiros até a realização de seus maiores sonhos.

A oportunidade de aprender cria gênios.


Como todos sabem Stephen Hawking é um premiado cientista e suas teorias contribuem para a compreensão do tempo, universo e surgimento da vida na terra. Ao descobrir a doença, a primeira preocupação de Stephen foi se ela atingiria sua capacidade cognitiva. 

Neste caminho, ele continuou a desenvolver sua tese e foi acolhido pelo seu professor que demonstrava respeito e crença na sua capacidade. Uma cena do filme retrata a fala do professor de Stephen em uma conferência pública em que expressa toda a admiração que tem por ele e confessa o privilégio que foi conviver e aprender muito com seu antigo aprendiz.

A pessoa com deficiência ainda é privada de aprender e desenvolver seus talentos. O imaginário coletivo das instituições educacionais é enraizado em crenças, estereótipos e mitos acerca do desenvolvimento cognitivo deste grupo social. Narrativas negativas ilustram descaso, segregação, discriminação e omissão de oportunidade de participação de crianças, jovens e adultos com deficiência no sistema de ensino regular.

A violação do direito à educação incapacita as pessoas com deficiência, que permanecem no abismo de (grande) desvantagem social, sem oportunidade de aprender, com poucas chances de sucesso escolar e sendo mínima a representatividade deste grupo — menos de 1% — que ascende a espaços de excelências na produção e disseminação de conhecimento, como as universidades.

A convivência entre pessoas com e sem deficiência em espaços de aprendizagem é benéfica não só para as pessoas com deficiência, mas para a comunidade. Este é um momento propício para troca de experiência e saberes e a oportunidade para se pensar em estratégias que diminuam barreiras educacionais.

Como visto na história de Stephen, o(a) professor(a) tem um papel preponderante porque ele(a) é autoridade que pode criar oportunidades para que estudantes com deficiência desenvolvam seu potencial.

Qual a primeira coisa que precisamos mudar para que pessoas com deficiência tenham oportunidade de aprender e desenvolver seus talentos? A resposta é simples: nossa atitude em relação a elas!

A quarta lição que podemos extrair do filme é que as pessoas com deficiência têm o direito de aprender, participar e interagir para isso é preciso que EXISTAM OPORTUNIDADES. O(a) professor(a) tem o poder de promover a inclusão e acessibilidade por meio de atitudes acolhedoras e abertas às diferentes formas de aprendizagem e de expressão de saberes. Para tanto, é urgente desconstruir concepções incapacitantes sobre pessoas com deficiência, de descrença em seu potencial e capacidade intelectual, principalmente quando são pessoas com deficiência com quadro complexos como paralisias, deficiências intelectuais e autismo.

Professores(as), não vamos desperdiçar talentos e gênios, vamos potenciá-los e descobri-los!


O corpo na sua diversidade transpira sexualidade.


Este último ponto reflexivo que o filme nos reporta é um tema tabu e inexplorado no Brasil: sexualidade e deficiência. Estudos indicam que as pessoas com deficiência são vistas como sujeitos assexuados, infantis e frígidos (Mertens et al., 2012; Denari, 2006). No entanto, a internet pouco a pouco vem publicizando conteúdos digitais que trazem à tona estes temas: ensaios sensuais de mulheres com deficiência para reforçar sua beleza e feminilidade; aplicativos de relacionamentos para que pessoas com diversidade funcional; relatos e filmagem de experiências sexuais de pessoas com deficiência, entre outros. Na maioria das vezes, as protagonistas são as próprias pessoas com deficiência que buscam desmistificar as concepções limitantes sobre sua sexualidade, gênero e orientação sexual.

Conheça o Projeto Espanhol “Yes, We Fuck”, coordenado por Antonio Centero, um usuário de cadeira de rodas que promove a discussão sobre a sexualidade de pessoas com diversidade funcional em fóruns e documentários de uma maneira livre, transgressora e anticapacitista. http://www.yeswefuck.org/

No filme, a experiência de Stephen Hawking evidencia que mesmo sua deficiência sendo de grau avançado, esta não foi a razão para ele não desfrutar de uma vida sexual plena. Stephen e Jane tinham uma relação amorosa como qualquer outro casal, explorando o lado sexual. Ele é pai de três filhos e, mais tarde, teve um relacionamento extraconjugal com sua enfermeira Elane Mason, com quem se casou pela segunda vez. Por causa da condição fisiológica de Stephen, muitas foram as especulações levantadas contra Jane, que foi julgada pela própria família de traí-lo e de mentir sobre a paternidade de seus filhos.

A discriminação vivida por Jane é resultado do controle da sexualidade das mulheres que são colocadas em juízo quando apresentam um comportamento conferido como inadequado e do ceticismo acerca do desempenho sexual de parceiros e parceiras com deficiência. As mulheres com deficiência são submetidas em dobro a tutela da família e Estado, aspecto que restringe sua vida sexual, seu ciclo de relações amorosas e seu direito à maternidade.

O corpo humano é uma zona sem limites, potenciada para dar e receber prazer. Por que as pessoas com deficiência permanecem destituídas de viver plenamente sua sexualidade? O que está por trás dessa restrição social?

A quarta lição que a história de Stephen Hawking incitou foi que homens e mulheres com deficiência têm os mesmos direitos que qualquer outro grupo de terem uma vida sexual ativa, livre e sem discriminação. A decisão quanto ao tipo de relação, acordos sentimentais e escolha de ter ou não filhos são demandas que dizem respeito as próprias pessoas com deficiência. 

Para isso, é preciso investir em políticas públicas e ações conjuntas que coloquem em debate este tema, deem visibilidade aos grupos de pessoas com deficiência que já vêm desenvolvendo ou queiram produzir campanhas de conscientização, forneçam informação adequada e acessível sobre gênero, saúde e sexualidade com vista a prevenção de gravidez, doenças sexualmente transmissíveis e abusos sexuais, finalmente, abram espaços públicos formais e de lazer para que pessoas com deficiência possam trocar de experiências e conhecer outras pessoas que queiram compartilhar e viver juntas uma vida amorosa e/ou sexual.

Como percebemos, este é um filme para guardar em nossos arquivos valiosos e sempre que preciso revê-lo para refletirmos sobre a experiência da deficiência no contexto contemporâneo.

REFERÊNCIAS

BRASIL. IBGE 2010. Disponível em: < http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/94/cd_2010_religiao_deficiencia.pdf >. Acesso em: 05 de jul. 2016.

CRUZ, M. H. S. Mapeando diferenças de gênero no ensino superior da Universidade Federal de Sergipe. São Cristóvão: Editora UFS, 2012.

DENARI, F.E. Adolescência & deficiência mental: desvendando aspectos de afetividade e sexualidade. In. 

MARTINS, A. R.S. et al. (Org.). Inclusão:compartilhando saberes. Petrópolis: Vozes, 2006.

FARIAS, A. Q. Gênero e Deficiência: Vulnerabilidade Feminina, Ruptura e superação. Dissertação (Mestrado em Educação) — Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa: UFPB, 2011.

FERREIRA, W. B. Invisibilidade, crenças e rótulos: Reflexão sobre a profecia do fracasso educacional na vida de jovens com deficiência. IV Congresso Brasileiro sobre Síndrome de Down. Família, a gente da inclusão. 09–11 de Setembro de 2004. Bahia.

OLIVER, M. 1983. Social work with disabled people. London: MacMillan. Disponível em: <http://www.icjp.pt/sites/default/files/media/723-1116.pdf>. Acesso em: 20 out. 2013.

ONU. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006).Disponível em: < http://www.assinoinclusao.org.br/downloads/convencao.pdf >. Acesso em: 03 jul. 2011.

SOARES, A. M. M. Nada sobre nós sem nós: estudo sobre a formação de jovens com deficiência para o exercício da autoadvocacia em uma ação de extensão universitária. 2010. Dissertação (Mestrado em Educação) — Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2010.