sexta-feira, 25 de março de 2016

Dane-se a legislação!!! Escolas escancaradamente recusam matrículas de pessoas com deficiência

Windyz Brazão Ferreira
Jackeline Susann Souza da Silva




O Brasil é o país das desigualdades e de muitas leis. Porque estou correlacionando leis à desigualdade social? Porque há uma proporcionalidade entre estes dois relevantes elementos que são inerentes às relações sociais de poder: quanto maior a vulnerabilidade de uma pessoa ou grupo social, maior a chance de ter seus direitos garantidos por leis violados sem que nada seja feito. No campo da inclusão escolar de pessoas com deficiência isso não para de acontecer!

Em 2005, escrevi um artigo para a Inclusão Revista de Educação Especial[1], cujo título era Educação Inclusiva: será que sou a favor ou contra uma escola de qualidade para todos??? Naquele ano decidi (re)tratar as justificativas, com diferentes alegações, de recusa sistemática de matrículas de estudantes com deficiência nas escolas brasileiras, entre as quais, ´a escola não está preparada´, ´não temos profissionais qualificados´, ´o número de alun@s por classe é muito alto´, etc. Nos dez anos seguintes, o MEC (primeiro a extinta Secretaria de Educação Especial- SEESP e depois, menos enfaticamente, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão - SECADI) apresentou dados oficiais das ´maravilhas´ do crescimento da inclusão escolar no país, leia-se, do crescimento no número de matrículas de estudantes com deficiência nas escolas brasileiras, os quais são maquiados por dados estatísticos que não fazem correlações com o total de matrículas na educação básica. Isto significa que o que parece um grande avanço é, estatisticamente, apenas um avanço proporcional ao crescimento do sistema educacional naqueles anos.

É verdade que mais crianças, jovens e adultos com deficiência tiveram acesso às matrículas nas escolas regulares após o lançamento do Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade[2]  do MEC que durou em torno de 10 anos no país (o ultimo documento é de 2011-12 (vide: http://portal.mec.gov.br/secretaria-de-educacao-continuada-alfabetizacao-diversidade-e-inclusao/programas-e-acoes?id=17434) . 

É verdade também que muita gente acreditou - pós lançamento, em 2008, da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEE-EI) - que a implantação do Atendimento Educacional Especializado (AEE) em Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) no contraturno escolar (absurdo em um país enorme como o nosso e com as crianças – muitas vezes – morando em bairros distantes!) das escolas públicas constituía uma orientação viável e promissora para efetivar a inclusão escolar. Paralelamente a este serviço, a PNEE-EI ´promete´ cuidador@s nas escolas para estudantes que precisam de apoio mais sistemático às suas necessidades, tradutor@s-intérpretes (T-I) para surdos, serviços de BRAILLE para cegos, entre outros. 

Como veremos abaixo, cuidador@s são escassos nas escolas, assim como T-I para surdos quase inexistente e o resultado é que @s surd@s continuam a ser agrupados em algumas escolas da rede para que ´tenham com quem conversar´ ao invés de terem acesso ao T-I em qualquer escola de forma que possam conviver com seus colegas surd@s ou não!  

Aqui vale a pena destacar que as escolas privadas continuam a ignorar e rejeitar as diretrizes políticas e o marco político-legal quando se trata de inclusão de pessoas com deficiências em suas escolas (vide Petição pela Inclusão em: http://www.inclusive.org.br/?p=28937). Ou seja, assim como para outras leis, as leis educacionais no Brasil somente valem para os grupos sociais em situação de vulnerabilidade e não para grupos da elite privilegiada. (Leia meu artigo: O conceito de diversidade no BNCC: relações de poder e interesses ocultos em: http://www.esforce.org.br/index.php/semestral/article/view/582 publicado em março de 2016)  

20 anos após o lançamento da Declaração de Salamanca pela UNESCO (1996), treze anos passados do Programa EI:dd do MEC e oito anos da política de inclusão as evidencias científicas e empíricas escancaram o fato de que nem o programa acima conseguiu mudar a cultura, a política e as práticas excludentes existentes nas escolas brasileiras e, muito menos ainda, o AEE constitui serviço de apoio ao estudante com deficiência que seja efetivo, tenha qualidade e esteja disponível em todas as escolas. As reportagens abaixam denunciam esta realidade:

Inclusão de fachada: alunos especiais perdem aulas por falta de mediadores na rede municipal do Rio. Leia na íntegra em clicando em: http://extra.globo.com/noticias/educacao/inclusao-de-fachada-alunos-especiais-perdem-aulas-por-falta-de-mediadores-na-rede-municipal-do-rio-18815299.html

Pessoas com deficiência são rejeitadas por escolas, apesar das leis que garantem acesso à educação. Leia na íntegra clicando em: http://www.metropoles.com/distrito-federal/educacao-df/pessoas-com-deficiencia-sao-rejeitadas-por-escolas-apesar-das-leis-que-garantem-acesso-a-educacao  (06/03/2016)


Pais lutam para matricular filhos com alguma deficiência em escolas regulares. Leia na íntegra clicando em: http://g1.globo.com/pb/paraiba/bom-dia-pb/videos/v/pais-lutam-para-matricular-filhos-com-algum-tipo-de-deficiencia-em-escolas-regulares/4750341/

Pagar taxa extra, explicar que já houve o ´preenchimento de cotas´ na escola para estudantes com deficiência (quem inventou esta ideia maluca???) e colocar o nome da criança ou do jovem em uma lista de espera, pagar cuidad@r ou ainda ´testar´ a presença da criança na escola (procrastinar como criminalizado na Lei 7853/89 e agora na Lei Brasileira de Inclusão - Lei  13.146/2015), ou dito de outra forma, testar a capacidade da criança de adaptação ao ambiente escolar conforme ditado pelo modelo médico, são as novas justificativa para discriminar e excluir escancaradamente, sem que o governo sequer mencione o fato e considere as inúmeras denúncias. Isto significa que – mais uma vez – o grupo social constituído pelas pessoas com deficiência e suas famílias está abandonado pelo poder público. Somente resta procurar o Ministério Público-MP e buscar seus direitos. Mas, quantas pessoas fazem uso deste procedimento? E, se fizessem, será que haveria como o MP dar conta do número de denúncias??? O fato é que existe uma correlação entre ´deficiência e pobreza´, de acordo com documentos internacionais (vide p.40 do Relatório Mundial sobre a Deficiência - http://www.pessoacomdeficiencia.sp.gov.br/usr/share/documents/RELATORIO_MUNDIAL_COMPLETO.pdf)  e, como sempre, são as famílias mais simples e mais sem recursos as que serão mais penalizadas pela violação dos direitos de seus filhos à educação.

Eu tenho me declarado, aberta e publicamente, contra à denominada ´política de inclusão escolar´ para estudantes com deficiência do governo federal via as SRM/AEE desde seu lançamento por várias razões:

(1)    entendo (como já comprovado) que este serviço não seria viabilizado nas mais de 190 mil escolas públicas em território nacional. Como o governo daria conta de implantar as SRM em todas escolas e com qualidade em termos de recursos materiais e humanos???

(2)    era óbvio que não haveria recursos financeiros na esfera federal e muito menos na estadual e municipal, previsão coroada com o fechamento da Secretaria de Educação Especial por Claudia Dutra[3], então Secretaria de Educação Especial, na calada da noite. Como manter a política de inclusão em curso sem verbas porque a verba da SEESP foi transferida para a SECADI e, certamente, diluída em outros programas considerados mais relevantes para a política partidária

(3)    em um país com dimensões territoriais como a brasileira e com a diversidade geográfica e cultural como a existente em cada região, como formar recursos humanos suficientes, com a qualidade requerida para atender às demandas desses estudantes? Estimular a criação de cursos à distância e que adotam o modelo médico com o foco na deficiência, com certeza não é o caminho apropriado para formar profissionais especializados para atuar junto ao público alvo da educação especial, segundo a Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL 2008) [1], qual seja, estudantes com deficiências sensoriais, intelectual e física; estudantes com transtorno global de desenvolvimento (autismo e espectro) e altas habilidades/superdotação.

Ao longo de quase 15 anos, as sistemáticas propagandas nos meios de comunicação, de alta qualidade, para vender o ´peixe da inclusão´ e as ações sistemáticas de formação de profissionais atuando nas secretarias dos municípios-pólo (no inicio 144 municípios e hoje reduzido a cinco municípios, sendo um em cada região brasileira – vide: http://portal.mec.gov.br/par/194-secretarias-112877938/secad-educacao-continuada-223369541/17503-relacao-dos-municipios-polos-e-respectivas-abrangencias), provocou a disseminação do discurso inclusivo e nos fez acreditar que tudo mudaria, mas o que vemos é ainda a perpetuação da exclusão destas pessoas com base em sua deficiência e a absoluta negligência do governo federal quanto à violação descarada de seus direitos. 

Tudo isso junto me leva a acreditar que devemos lutar pela (re)instituição de uma Secretaria de Inclusão Escolar (em substituição da SEESP), uma vez que esta população constitui no Brasil em torno de 45 milhões de pessoas...  
[1] Educação Inclusiva: será que sou a favor ou contra uma escola de qualidade para todos??? Disponível em:  http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/revistainclusao1.pdf pp. 40-46)
[3] Embora tenha sido submetida à consulta pública, a política foi construída na gestão de Claudia Pereira Dutra[3], Secretaria de Educação Especial e responsável pelo fechamento da mesma, com a colaboração de acadêmicos. (Vide paginas 2 e 3 do documento em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf)   


domingo, 13 de março de 2016

Cartilha sobre Gentle Teaching (John MacGee)

(Tradução: Windyz B Ferreira do documento
Primer on Gentle Teaching e partes de vídeos)


Gentle Teaching (tradução: Ensino Gentil) é uma abordagem criada por John MacGee, um americano que viveu no nordeste brasileiro e conheceu nossa cultura, assim como a teoria de Paulo Freire. Al voltar para os EUA, John fez um Doutorado e desenvolveu a abordagem hoje, conhecida como Gentle Teaching.

Gentle Teaching (também traduzido pelo psicólogo Mario Soares, diretor da ASSOL- www.assol.pt)como Pedagogia do Companheirismo e da Interdependência) é muitas coisas...

·       Gentileza em direção a outros é um fator crítico, independentemente do que qualquer pessoa faça ou não faça. It is a paradox.

·       -  Punhos devem ser encontrados com abraços.

·       -  Chingamentos e amaldiçoar o outro/a deve ser encontrado com palavras de afeição e carinho

·       - Olhos que oferecem desprezo devem ser encontrados com calor.

A gentileza reconhece que toda mudança é mutua e entrelaçada, se inicia com os cuidadores e, espera-se, toque aqueles que são os mais vulneráveis e seu foco central é expressar incondicionalmente amor.

·       É uma referência em torno da Psicologia da Interdependência humana.

A ideia principal da gentileza é não se livrar do comportamento de alguém, mas aprofundar nosso próprio sentimentos internos de gentileza frente à (comportamentos) de violência ou desconsideração.

Gentle Teaching é também uma abordagem de ensino e tem 4 propósitos iniciais: Ensinar outros a se sentir:

- Seguro: você está seguro comigo... não tenha medo...

- Amado: sinta-se amado por mim...

- Amando: seja amável para mim...  

 - Envolvido: envolva-se comigo...

Não importa em que língua você mostre ou fale ´isso´, a pessoa gradualmente vai entender. (Veja o vídeo a seguir, em inglês, da interação do John com Ronald. Não é necessário entender inglês)



Estes propósitos não acontecem simplesmente.
Eles são ensinados por meio de ações repetidas de atos de amor.

Cuidadores Gentis aprendem a usar sua presença, mãos, palavras e olhos como seus primeiros instrumentos para elevar e honrar outros. As pessoas com ´os corações partidos´ vão sentir que minha presença, minhas palavras, meus olhos e toque are bons, não machucam...  

OBS. Há vídeos com John MacGee falando sobre GT em inglês no youtube. Abaixo alguns links...







Meu contato com GT e com John MacGee... 

Eu conheci John MacGee em 2009 em Portugal na Conferência Internacional organizada por Mário Pereira, diretor da ASSOL. John fala português muito bem, foi casado com uma brasileira (John faleceu em 2014) e é a personificação do que nos ensina com o Gentle Teaching. Desde então, eu participei das Conferências que aconteceram na Holanda (2010), na Dinamarca (2012) e na Grécia (2014). ESte ano a Conferência será realizada na Islândia. Sempre é realizada em setembro.

A aplicação desta abordagem foi iniciada há, em torno de 30 anos atrás, com pacientes institucionalizados e que eram frequentemente mau tratados, machucados, trancafiados, etc. Foi muito usada em instituições para pessoas autistas, por seu ´comportamento não social´... Hoje, o GT é aplicado em organizações, escolas, instituições, hospitais, etc. de mais de 25 países.

Em outubro de 2015, convidei o Mario Pereira para vir ao Brasil e dar um curso para famílias de pessoas autistas. O curso foi realizado em João Pessoa e envolveu 20 famílias. Meu objetivo é compartilhar esta abordagem no Brasil e apoiar pontes para famílias interessadas. 

terça-feira, 8 de março de 2016

O Dia Internacional da Mulher: algumas considerações sobre violências contra mulheres com deficiência

Anahi Guedes de Mello

Antropóloga, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina e pesquisadora vinculada ao Núcleo de Identidades de Gênero e Subjetividades e ao Núcleo de Estudos sobre Deficiência (NIGS/NED/UFSC). Tem experiência em Estudos sobre Deficiência, desenvolvendo pesquisas sobre gênero e deficiência, sexualidades, violências contra mulheres com deficiência, acessibilidade e tecnologia assistiva.


Em uma pesquisa envolvendo as percepções da opinião pública em relação aos direitos humanos das pessoas com deficiência no Brasil, Debora Diniz e Lívia Barbosa afirmam que “embora as pessoas reconheçam a discriminação existente contra indivíduos com deficiência, não a traduzem sob a forma de violência ou maus-tratos” [1]. Prosseguem as autoras alertando que “em uma lista com oito tipos de violência, apenas 5% das pessoas responderam que a violência contra pessoas com deficiência deveria ser combatida em primeiro lugar”.

Duas hipóteses explicam esse resultado: “ou esse fenômeno inexiste na vida cotidiana das pessoas deficientes e de suas cuidadoras, ou a subnotificação impõe uma regra perversa de silêncio. O fato é que inexistem dados sobre a magnitude da violência contra deficientes no Brasil”[idem]. Sustentam que uma possível explicação para a pouca relevância dada a pesquisas sobre esse tema no Brasil se deve ao fato do debate público e midiático da agenda da deficiência se concentrar nas necessidades de saúde, transporte e trabalho. Para elas, as violências contra pessoas com deficiência se mantêm na esfera privada, não sendo percebidas como uma questão de direitos humanos. E os poucos estudos localizados apontam a violência doméstica como o tipo mais frequente de violência praticada contra esse segmento. Entretanto, do ponto de vista da interseção entre gênero, deficiência e violência, os poucos estudos nacionais, amparados por referências internacionais, evidenciam o argumento da maior vulnerabilidade de mulheres com deficiência a sofrer violências na esfera doméstica e familiar.

Os dados analisados comprovam a tese de que são essas mulheres as mais vulneráveis a sofrer abusos, maus-tratos, lesões, abandono e negligências por parte de familiares e agentes estatais. Contrariamente ao apontado na mídia e em publicações feministas sobre violência doméstica contra a mulher no âmbito conjugal, em que a dependência financeira e emocional são os principais motivos pelos quais as mulheres desistem de denunciar seus agressores, a maioria homens, nas violências contra mulheres com deficiência, a questão da independência financeira fica em segundo plano, pois a primeira pergunta que emerge é: “Quem vai cuidar de mim?”. Essa “rede de cuidados” geralmente inclui pessoas de sua rede de parentesco, majoritariamente mães, pais, irmãos, irmãs, filhos e filhas que, em maior ou menor grau, cuidam ou deveriam cuidar da/do sua/ seu filha/filho, irmã/irmão e mãe/pai com deficiência. Também podem envolver a participação de profissionais das áreas de saúde ligadas ao cuidado (principalmente Enfermagem, Mastologia e Ginecologia).

Desse modo, as violências contra mulheres com deficiência não ocorrem majoritariamente no contexto das relações conjugais (por exemplo, marido contra mulher em uma relação heterossexual), mas têm mais proximidade com os debates envolvendo a violência doméstica contra pessoas idosas, justamente porque ambas canalizam o contorno dos corpos com impedimentos que necessitam da assistência de longa duração para desenvolver, potencializar ou manter suas capacidades básicas.

O presente texto se baseia em minha dissertação de mestrado em Antropologia Social pela UFSC, defendida em fevereiro de 2014 sob o título “Gênero, Deficiência, Cuidado e Capacitismo: uma análise antropológica sobre experiências, observações e narrativas sobre violências contra mulheres com deficiência”.

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[1] DINIZ, D.; BARBOSA, L. Pessoas com Deficiência e Direitos Humanos no Brasil. In.: VENTURI, G. (Org.). Direitos Humanos: percepções da opinião pública – análises de pesquisa nacional. Brasília: Secretaria de Direitos Humanos, 2010. p. 211. 3) Diniz e Barbosa, loc. cit 

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Disponível: http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/sites/default/files/arquivos/%5Bfield_generico_imagens-filefield-description%5D_100.pdf 

Para conhecer mais sobre o campo dos Estudos sobre a Deficiência no país e Anahi G de Mello, assista ao vídeo abaixo:





segunda-feira, 7 de março de 2016

Estudos sobre a Deficiência: Para além da Educação Especial e da Educação Inclusiva

Jackeline Susann S. Silva
jackeline-susann@hotmail.com


O cenário negativo que narra a história de pessoas com deficiência fundamentou o crescimento e a consolidação, a partir do final do século passado, de um marco político-legal para a inclusão social e educacional deste grupo no Brasil (BRASIL, 1996, 2000, 2002, 2003, 2004, 2008, 2011, 2015). Este marco político é, hoje, reconhecido mundialmente. Contudo, os resultados de estudos e ‘a vida real’ de pessoas com deficiência indicam que a violação dos direitos deste grupo social se mantém praticamente inalterado. Exatamente, por isso, ações que promovam rupturas com a concepção médica, biológica e incapacitante da pessoa com deficiência são urgentes e cruciais no atual panorama brasileiro.

Com o impacto da política de inclusão no Brasil houve a significativa expansão no número de pesquisadores e pesquisadoras interessados/as em investigar temas relevantes nas várias esferas da vida da pessoa com deficiência. No campo da educação, cabe destacar a Rede Nacional de Pesquisadores que faz parte do Observatório da Educação Especial – 2010-2014, financiado pela CAPES (www.oneesp.ufscar.com.br). A recente Coleção do ONEESP traz o histórico, dados sobre implementação e política de Salas de Recursos Multifuncionais nas escolas regulares em todas as regiões do país e análises dos/as pesquisadores/as sobre a prática da política de inclusão na realidade nacional.

Sem dúvida, houve progressos na área, mas não foram e não são suficientes para promover rupturas conceituais, metodológicas e culturais importantes para o grupo de pessoas com deficiência. Os resquícios da perspectiva médica da deficiência influenciaram os campos da educação especial e, agora, da educação inclusiva que permanecem um lugar de produção ilhado e disciplinar. Em outras palavras, assim como ocorreu a segregação das pessoas com deficiência nos espaços da vida comum, há a segregação da produção de conhecimento deste grupo que se mantém distante daquilo que é discutido nos outros campos de conhecimento e no próprio <<grande>> campo da educação, por causa da conseguente separação da educação das pessoas com deficiência por essa ser considerada <<especial>>, <<inclusiva>> e <<especializada>>.

Ainda com pouca visibilidade, pesquisadoras e pesquisadores com e sem deficiência do campo dos Estudos sobre a Deficiência têm chamado atenção as novas maneiras interdisciplinares de se pensar a "experiência da deficiência" pelo prisma dos Estudos Feministas, dos Estudos Culturais, da Sociologia, entre outros.
  
Os Estudos sobre a Deficiência, apesar de iniciados na segunda metade do século passado, ainda são poucos conhecidos e disseminados no Brasil, país com dimensões continentais que, como consequência, dificulta a identificação de iniciativas acadêmicas ou institucionais relativas à pessoa com deficiência. Somente em Junho de 2013 foi realizado o “I Simpósio Internacional de Estudos sobre a Deficiência: Conflitos, Direitos e Diversidade”, promovido pela Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Estado de São Paulo. Ou seja, é indiscutível e urgente a necessidade de pesquisar, analisar e caracterizar a história dos Estudos sobre Deficiência no Brasil:

Os chamados Disability Studies consistem num campo de estudos interdisciplinar que ganhou projeção mundial, tendo origem no contexto anglo-saxão, em meados da década de 1960. A proposta principal desse movimento intelectual, que mais tarde, acabou compondo os discursos dos movimentos ligados aos direitos das pessoas com deficiência, é a de que a deficiência não é simplesmente uma tragédia individual cuja “solução” estaria reservada aos quartos dos hospitais e centros de reabilitação. 
Ela é muito mais do que isso, portando dimensões essencialmente sociais e políticasNessa perspectiva, as inciativas nesse campo visam gerar debates públicos que desconstroem preconceitos e retiram da deficiência a noção de ‘doença’, ‘degeneração’ e ‘desvio’ e a situam na perspectiva de uma condição da diversidade humana – como mulheres, negros, gays, indígenas e outras minorias – sem, no entanto, criar rótulos e identidades férreas. 
(citação disponível em: 


O ativismo das pessoas com deficiência e simpatizantes, vinculado ao movimento dos Estudos sobre a Deficiência, portanto, representa a denúncia e a contestação contra a estrutura social incapacitante e a consequente opressão e violação dos seus direitos (MARTINS et. Al, 2012). 

Nós, pessoas sem deficiência, simpatizantes, acadêmicos, pesquisadores/as e outros, precisamos sair do lugar comum de percepção da deficiência como única identidade da pessoa com deficiência. Precisamos nos esforçar para desconstruir a ideia de mera adaptação da pessoa com deficiência aos múltiplos ambientes e às relações humanas, que ainda são incompatíveis com suas identidades, diferenças e demandas. As políticas públicas, as ações coletivas conscientes sobre os direitos das pessoas com deficiência e o protagonismo deste grupo são poderosos instrumentos de mudança social e, nós devemos contribuir para tais mudanças. 

Agora é a vez das pessoas sem deficiência respeitarem o protagonismo de pessoas com deficiência e o lema 
"Nada sobre Nós sem Nós"

Para mais informações sobre os Estudos sobre a Deficiência acesse: