Anahi
Guedes de Mello
Antropóloga, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em
Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina e pesquisadora
vinculada ao Núcleo de Identidades de Gênero e Subjetividades e ao Núcleo de
Estudos sobre Deficiência (NIGS/NED/UFSC). Tem experiência em Estudos
sobre Deficiência, desenvolvendo pesquisas sobre gênero e deficiência,
sexualidades, violências contra mulheres com deficiência, acessibilidade e
tecnologia assistiva.
Em
uma pesquisa envolvendo as percepções da opinião pública em relação aos
direitos humanos das pessoas com deficiência no Brasil, Debora Diniz e Lívia
Barbosa afirmam que “embora as pessoas reconheçam a discriminação existente
contra indivíduos com deficiência, não a traduzem sob a forma de violência ou
maus-tratos” [1]. Prosseguem as autoras alertando que “em uma lista com oito
tipos de violência, apenas 5% das pessoas responderam que a violência contra
pessoas com deficiência deveria ser combatida em primeiro lugar”.
Duas
hipóteses explicam esse resultado: “ou esse fenômeno inexiste na vida cotidiana
das pessoas deficientes e de suas cuidadoras, ou a subnotificação impõe uma
regra perversa de silêncio. O fato é que inexistem dados sobre a magnitude da
violência contra deficientes no Brasil”[idem]. Sustentam que uma possível
explicação para a pouca relevância dada a pesquisas sobre esse tema no Brasil
se deve ao fato do debate público e midiático da agenda da deficiência se
concentrar nas necessidades de saúde, transporte e trabalho. Para elas, as
violências contra pessoas com deficiência se mantêm na esfera privada, não
sendo percebidas como uma questão de direitos humanos. E os poucos estudos
localizados apontam a violência doméstica como o tipo mais frequente de
violência praticada contra esse segmento. Entretanto, do ponto de vista da
interseção entre gênero, deficiência e violência, os poucos estudos nacionais,
amparados por referências internacionais, evidenciam o argumento da maior
vulnerabilidade de mulheres com deficiência a sofrer violências na esfera
doméstica e familiar.
Os
dados analisados comprovam a tese de que são essas mulheres as mais vulneráveis
a sofrer abusos, maus-tratos, lesões, abandono e negligências por parte de
familiares e agentes estatais. Contrariamente ao apontado na mídia e em
publicações feministas sobre violência doméstica contra a mulher no âmbito
conjugal, em que a dependência financeira e emocional são os principais motivos
pelos quais as mulheres desistem de denunciar seus agressores, a maioria
homens, nas violências contra mulheres com deficiência, a questão da
independência financeira fica em segundo plano, pois a primeira pergunta que
emerge é: “Quem vai cuidar de mim?”. Essa “rede de cuidados” geralmente inclui
pessoas de sua rede de parentesco, majoritariamente mães, pais, irmãos, irmãs,
filhos e filhas que, em maior ou menor grau, cuidam ou deveriam cuidar da/do
sua/ seu filha/filho, irmã/irmão e mãe/pai com deficiência. Também podem
envolver a participação de profissionais das áreas de saúde ligadas ao cuidado
(principalmente Enfermagem, Mastologia e Ginecologia).
Desse
modo, as violências contra mulheres com deficiência não ocorrem
majoritariamente no contexto das relações conjugais (por exemplo, marido contra
mulher em uma relação heterossexual), mas têm mais proximidade com os debates
envolvendo a violência doméstica contra pessoas idosas, justamente porque ambas
canalizam o contorno dos corpos com impedimentos que necessitam da assistência de
longa duração para desenvolver, potencializar ou manter suas capacidades
básicas.
O
presente texto se baseia em minha dissertação de mestrado em Antropologia
Social pela UFSC, defendida em fevereiro de 2014 sob o título “Gênero,
Deficiência, Cuidado e Capacitismo: uma análise antropológica sobre
experiências, observações e narrativas sobre violências contra mulheres com
deficiência”.
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[1] DINIZ, D.; BARBOSA, L.
Pessoas com Deficiência e Direitos Humanos no Brasil. In.: VENTURI, G. (Org.).
Direitos Humanos: percepções da opinião pública – análises de pesquisa
nacional. Brasília: Secretaria de Direitos Humanos, 2010. p. 211. 3) Diniz e
Barbosa, loc. cit
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Disponível: http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/sites/default/files/arquivos/%5Bfield_generico_imagens-filefield-description%5D_100.pdf
Para conhecer mais sobre o campo dos Estudos sobre a Deficiência no país e Anahi G de Mello, assista ao vídeo abaixo:
Para conhecer mais sobre o campo dos Estudos sobre a Deficiência no país e Anahi G de Mello, assista ao vídeo abaixo:
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