Windyz Brazão Ferreira
Jackeline Susann Souza da Silva
O Brasil é o país das desigualdades e de muitas leis. Porque
estou correlacionando leis à desigualdade social? Porque há uma
proporcionalidade entre estes dois relevantes elementos que são inerentes às
relações sociais de poder: quanto maior a vulnerabilidade de uma pessoa ou
grupo social, maior a chance de ter seus direitos garantidos por leis violados sem
que nada seja feito. No campo da inclusão escolar de pessoas com deficiência
isso não para de acontecer!
Em 2005, escrevi um artigo para a Inclusão Revista
de Educação Especial[1], cujo título era Educação
Inclusiva: será que sou a favor ou contra uma escola de qualidade para
todos??? Naquele ano decidi (re)tratar as justificativas, com diferentes
alegações, de recusa sistemática de matrículas de estudantes com deficiência
nas escolas brasileiras, entre as quais, ´a escola não está preparada´, ´não
temos profissionais qualificados´, ´o número de alun@s por classe é muito
alto´, etc. Nos dez anos seguintes, o MEC (primeiro a extinta Secretaria de
Educação Especial- SEESP e depois, menos enfaticamente, a Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão - SECADI) apresentou
dados oficiais das ´maravilhas´ do crescimento da inclusão escolar no país,
leia-se, do crescimento no número de matrículas de estudantes com deficiência
nas escolas brasileiras, os quais são maquiados por dados estatísticos que não
fazem correlações com o total de matrículas na educação básica. Isto significa
que o que parece um grande avanço é, estatisticamente, apenas um avanço
proporcional ao crescimento do sistema educacional naqueles anos.
É verdade que mais crianças, jovens e adultos com deficiência
tiveram acesso às matrículas nas escolas regulares após o lançamento do Programa
Educação Inclusiva: direito à diversidade[2] do
MEC que durou em torno de 10 anos no país (o ultimo documento é de 2011-12
(vide: http://portal.mec.gov.br/secretaria-de-educacao-continuada-alfabetizacao-diversidade-e-inclusao/programas-e-acoes?id=17434)
.
É verdade também que muita gente acreditou - pós lançamento, em 2008, da
Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
(PNEE-EI) - que a implantação do Atendimento Educacional Especializado (AEE) em
Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) no contraturno escolar (absurdo em um
país enorme como o nosso e com as crianças – muitas vezes – morando em bairros
distantes!) das escolas públicas constituía uma orientação viável e promissora
para efetivar a inclusão escolar. Paralelamente a este serviço, a PNEE-EI
´promete´ cuidador@s nas escolas para estudantes que precisam de apoio mais
sistemático às suas necessidades, tradutor@s-intérpretes (T-I) para surdos,
serviços de BRAILLE para cegos, entre outros.
Como veremos abaixo, cuidador@s
são escassos nas escolas, assim como T-I para surdos quase inexistente e o
resultado é que @s surd@s continuam a ser agrupados em algumas escolas da rede
para que ´tenham com quem conversar´ ao invés de terem acesso ao T-I em
qualquer escola de forma que possam conviver com seus colegas surd@s ou não!
Aqui vale a pena destacar que as escolas privadas continuam
a ignorar e rejeitar as diretrizes políticas e o marco político-legal quando se
trata de inclusão de pessoas com deficiências em suas escolas (vide Petição
pela Inclusão em: http://www.inclusive.org.br/?p=28937).
Ou seja, assim como para outras leis, as leis educacionais no Brasil somente
valem para os grupos sociais em situação de vulnerabilidade e não para grupos
da elite privilegiada. (Leia meu artigo: O conceito de diversidade no BNCC:
relações de poder e interesses ocultos em: http://www.esforce.org.br/index.php/semestral/article/view/582 publicado
em março de 2016)
20 anos após o lançamento da Declaração de Salamanca pela
UNESCO (1996), treze anos passados do Programa EI:dd do MEC e oito anos da
política de inclusão as evidencias científicas e empíricas escancaram o fato de
que nem o programa acima conseguiu mudar a cultura, a política e as práticas
excludentes existentes nas escolas brasileiras e, muito menos ainda, o AEE
constitui serviço de apoio ao estudante com deficiência que seja efetivo, tenha
qualidade e esteja disponível em todas as escolas. As reportagens abaixam
denunciam esta realidade:
Inclusão de fachada: alunos especiais perdem aulas por falta
de mediadores na rede municipal do Rio. Leia na íntegra em clicando em: http://extra.globo.com/noticias/educacao/inclusao-de-fachada-alunos-especiais-perdem-aulas-por-falta-de-mediadores-na-rede-municipal-do-rio-18815299.html
Pessoas com deficiência são rejeitadas por escolas, apesar
das leis que garantem acesso à educação. Leia na íntegra clicando em: http://www.metropoles.com/distrito-federal/educacao-df/pessoas-com-deficiencia-sao-rejeitadas-por-escolas-apesar-das-leis-que-garantem-acesso-a-educacao
(06/03/2016)
Leia na íntegra clicando em: http://www.metropoles.com/vida-e-estilo/comportamento/escola-particular-na-asa-norte-expulsa-aluno-autista-e-e-condenada-a-indenizar-familia
Pais lutam para matricular filhos com alguma deficiência em
escolas regulares. Leia na íntegra clicando em: http://g1.globo.com/pb/paraiba/bom-dia-pb/videos/v/pais-lutam-para-matricular-filhos-com-algum-tipo-de-deficiencia-em-escolas-regulares/4750341/
Pagar taxa extra, explicar que já houve o ´preenchimento de
cotas´ na escola para estudantes com deficiência (quem inventou esta ideia
maluca???) e colocar o nome da criança ou do jovem em uma lista de espera,
pagar cuidad@r ou ainda ´testar´ a presença da criança na escola (procrastinar como
criminalizado na Lei 7853/89 e agora na Lei Brasileira de Inclusão - Lei
13.146/2015), ou dito de outra forma, testar a capacidade da criança de
adaptação ao ambiente escolar conforme ditado pelo modelo médico, são as novas
justificativa para discriminar e excluir escancaradamente, sem que o governo
sequer mencione o fato e considere as inúmeras denúncias. Isto significa que –
mais uma vez – o grupo social constituído pelas pessoas com deficiência e suas
famílias está abandonado pelo poder público. Somente resta procurar o
Ministério Público-MP e buscar seus direitos. Mas, quantas pessoas fazem uso
deste procedimento? E, se fizessem, será que haveria como o MP dar conta do
número de denúncias??? O fato é que existe uma correlação entre ´deficiência e
pobreza´, de acordo com documentos internacionais (vide p.40 do Relatório
Mundial sobre a Deficiência - http://www.pessoacomdeficiencia.sp.gov.br/usr/share/documents/RELATORIO_MUNDIAL_COMPLETO.pdf)
e, como sempre, são as famílias mais simples e mais sem recursos as que
serão mais penalizadas pela violação dos direitos de seus filhos à educação.
Eu tenho me declarado, aberta e publicamente, contra à
denominada ´política de inclusão escolar´ para estudantes com deficiência do
governo federal via as SRM/AEE desde seu lançamento por várias razões:
(1) entendo (como já comprovado) que
este serviço não seria viabilizado nas mais de 190 mil escolas públicas em
território nacional. Como o governo daria conta de implantar as SRM em todas
escolas e com qualidade em termos de recursos materiais e humanos???
(2) era óbvio que não haveria
recursos financeiros na esfera federal e muito menos na estadual e municipal,
previsão coroada com o fechamento da Secretaria de Educação Especial por
Claudia Dutra[3], então Secretaria de Educação Especial,
na calada da noite. Como manter a política de inclusão em curso sem verbas porque
a verba da SEESP foi transferida para a SECADI e, certamente, diluída em outros
programas considerados mais relevantes para a política partidária
(3) em um país com dimensões
territoriais como a brasileira e com a diversidade geográfica e cultural como a
existente em cada região, como formar recursos humanos suficientes, com a
qualidade requerida para atender às demandas desses estudantes? Estimular a
criação de cursos à distância e que adotam o modelo médico com o foco na
deficiência, com certeza não é o caminho apropriado para formar profissionais
especializados para atuar junto ao público alvo da educação especial, segundo a
Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
(BRASIL 2008) [1], qual seja, estudantes com deficiências sensoriais,
intelectual e física; estudantes com transtorno global de desenvolvimento
(autismo e espectro) e altas habilidades/superdotação.
Ao longo de quase 15 anos, as sistemáticas propagandas nos
meios de comunicação, de alta qualidade, para vender o ´peixe da inclusão´ e as
ações sistemáticas de formação de profissionais atuando nas secretarias dos
municípios-pólo (no inicio 144 municípios e hoje reduzido a cinco municípios,
sendo um em cada região brasileira – vide: http://portal.mec.gov.br/par/194-secretarias-112877938/secad-educacao-continuada-223369541/17503-relacao-dos-municipios-polos-e-respectivas-abrangencias),
provocou a disseminação do discurso inclusivo e nos fez acreditar que tudo
mudaria, mas o que vemos é ainda a perpetuação da exclusão destas pessoas com
base em sua deficiência e a absoluta negligência do governo federal quanto à
violação descarada de seus direitos.
Tudo isso junto me leva a acreditar que
devemos lutar pela (re)instituição de uma Secretaria de Inclusão Escolar (em
substituição da SEESP), uma vez que esta população constitui no Brasil em torno
de 45 milhões de pessoas...
[1] Educação
Inclusiva: será que sou a favor ou contra uma escola de qualidade para
todos??? Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/revistainclusao1.pdf pp.
40-46)
[3] Embora tenha sido submetida à consulta pública,
a política foi construída na gestão de Claudia Pereira Dutra[3], Secretaria de
Educação Especial e responsável pelo fechamento da mesma, com a colaboração de
acadêmicos. (Vide paginas 2 e 3 do documento em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf)
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